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3 de setembro de 2013

SBHC propõe emendas ao Projeto de Lei 4699/2012

Em reunião realizada no dia 03 de setembro, com a participação de representantes de várias entidades, a Sociedade Brasileira de História da Ciência (SBHC) sugeriu algumas mudanças no Projeto de Lei 4699/2012 de regulamentação da profissão de historiador.


Apresentamos a seguir o texto completo do Projeto de Lei original, indicando as modificações apresentadas pela SBHC (em vermelho). Após o texto, são também indicados os motivos pelos quais essas mudanças foram sugeridas.


PROJETO DE LEI 4699/2012
Regulamenta a profissão de historiador e dá outras providências.


CONGRESSO NACIONAL decreta:
Art. 1º Esta Lei regulamenta a profissão de historiador, estabelece os requisitos para o exercício da atividade profissional e determina o registro em órgão competente.
Art. 2º É livre o exercício da atividade profissional de historiador, desde que atendidas às qualificações e exigências estabelecidas nesta Lei.
Art. 3º O exercício da profissão de historiador, em todo o território nacional, é privativa dos portadores de: O exercício da profissão de Historiador é assegurado:
I – aos portadores de diploma de curso superior em História ou História da Arte, expedido por instituição regular de ensino;
II – aos portadores de diploma de curso superior em História, expedido por instituição estrangeira e revalidado no Brasil, de acordo com a legislação; 
III – aos portadores de diploma de mestrado ou doutorado em História, expedido por instituição regular de ensino superior, ou por instituição estrangeira e revalidado no Brasil, de acordo com a legislação;
IV – aos portadores de diploma de mestrado ou doutorado obtido em linhas de pesquisa ou áreas de concentração de natureza histórica de programas de pós-graduação reconhecidos pela legislação;
V – aos que, embora não diplomados nos termos dos itens anteriores, exerçam, comprovadamente, até a data de publicação da presente Lei, há 5 (cinco) ou mais anos, atividades próprias do Historiador.
Art. 4º São atribuições dos historiadores: Dar-se-á preferência aos historiadores, nos termos do Art.  3º desta Lei, para o exercício das seguintes atribuições:
I – magistério da disciplina de História nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio e superior;
II – organização de informações para publicações, exposições e eventos sobre temas de História;
III – planejamento, organização, implantação e direção de serviços de pesquisa histórica;
IV – assessoramento, organização, implantação e direção de serviços de documentação e informação histórica;
V – assessoramento voltado à avaliação e seleção de documentos, para fins de preservação;
VI – elaboração de pareceres, relatórios, planos, projetos, laudos e trabalhos sobre temas históricos.
Parágrafo único – Para o desempenho das atividades previstas no inciso I é obrigatória a formação em curso de licenciatura.
Art. 5º Para o provimento e exercício de cargos, funções ou empregos de historiador, é obrigatória a apresentação de diploma nos termos do art. 3º desta Lei. comprovação de registro profissional nos termos do art. 7º desta Lei.
Art. 6º As entidades que prestam serviços em História manterão, em seu quadro de pessoal ou em regime de contrato para prestação de serviços, historiadores legalmente habilitados.
Art. 7º O exercício da profissão de historiador requer prévio registro na Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do local onde o profissional irá atuar.
Art. 8º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Comentários

1. A mudança de redação proposta para o caput do Art. 3º sinaliza o espírito da lei como garantidora de direitos, e não restritora, sendo inspirada pelos termos do PL 3759/2004, que também visava à regulamentação da profissão de historiador. Permite ainda a introdução dos dois novos incisos, IV e V, com alteração mínima na redação dos três primeiros, já existentes.

2. No caso do inciso I, sugerimos a inclusão explícita dos cursos superiores de História da Arte, tendo em vista sua existência já consolidada em diversas universidades públicas brasileiras, muitas do sistema federal, e a clara tendência à sua expansão.

3. O inciso IV dá conta da necessidade de que a lei reconheça a possibilidade de plena capacitação profissional por um caminho que não está previsto em sua forma atual, mas é notório: a formação que é obtida em linhas de pesquisa ou áreas de concentração (termos da normatização empregada pela CAPES/MEC) de natureza histórica alocadas em programas de pós-graduação que não pertencem direta ou exclusivamente à História. Esse é o caso, por exemplo, de muitos programas de pós-graduação interdisciplinares, altamente estimulados pelo Governo Federal e pelo sistema brasileiro de Ensino Superior, que contam com áreas ou linhas de história das ciências em convívio saudável com temas de filosofia ou ensino científico. É também o caso de inúmeros programas de mestrado e doutorado em Educação ou Artes, que abrigam setores importantíssimos de história dessas áreas. A comprovação de que o trabalho foi realizado dentro de uma dessas áreas ou linhas é simples, do ponto de vista operacional da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego, que fará o registro: se já não constar do diploma, é uma informação oficial, que pode ser atestada pela pró-reitoria de pós-graduação ou órgão equivalente da universidade, tendo em vista que as áreas e linhas dos programas são formalmente registradas junto ao Governo Federal, através da CAPES.

4. O novo inciso V do Art. 3º garante o irrestrito reconhecimento profissional de todas as pessoas já atuantes como historiadores, incluindo docentes de qualquer nível de ensino (o que é especialmente importante no caso, entre outros, de professores de História na educação básica que foram licenciados nos antigos cursos de Estudos Sociais, e exercem a profissão muitas vezes há décadas). Esse mecanismo de incorporação plena é bem conhecido na história legislativa brasileira concernente à regulamentação profissional, tendo sido empregado, por exemplo, no caso dos geógrafos, sociólogos e museólogos, e previsto nos PLs 3759/2004 e 7321/2006, que tratavam do caso dos historiadores. Já existe sistemática consagrada pelas Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego para lidar com esses casos, envolvendo a análise de documentos comprobatórios que não precisam ser especificados na lei

5. A redação proposta para o caput do Art. 4º tem como objetivo dissipar qualquer dúvida quanto ao direito de toda e qualquer pessoa pesquisar o passado, escrever a seu respeito, publicar suas opiniões, emitir seus juízos, organizar seus arquivos, eventos comemorativos ou de desagravo, e tudo o mais que constitui a intangível matéria da memória, cujo tratamento profissional é, este sim, próprio do historiador. O reconhecimento legal da existência dessa profissão não se altera em nada por causa dessa redação (com os três primeiros artigos ela está formalmente criada), e ainda se torna claro para toda a sociedade, definitivamente, que ninguém perderá esses direitos. A criação de cargos para historiadores profissionais continuará sendo possível (além de evidentemente preferencial), e mesmo obrigatória, tendo em vista os Arts. 5º e 6º. Esta forma do caput ainda tem a vantagem adicional de não gerar uma oposição (possivelmente insustentável) ao projeto por parte do MEC, Secretarias e Conselhos Estaduais de Educação, que ainda precisam, no Brasil de hoje, suprir as enormes carências de professores com soluções que, mesmo distantes do ideal, não podem desaparecer de imediato – ou seja, permanece possível que os Conselhos decidam sobre a possibilidade de que licenciados em outras áreas ministrem aulas de História na educação básica, na ausência de historiadores em número suficiente (e estes têm explicitamente a preferência).

6. A alteração proposta no inciso I do Art. 4º responde à necessidade de se garantir o princípio constitucional da autonomia universitária, materializado, no caso da contratação de docentes para o magistério de qualquer disciplina, pelo imperativo da formação pós-graduada e notório saber (como prescrito pela LDB). Assim é que, por exemplo, até no caso de profissões regulamentadas já remotamente, como a medicina ou o direito, os professores dos cursos universitários dessas áreas jamais são somente médicos ou advogados, mas incluem biólogos, farmacêuticos, filósofos, sociólogos – e mesmo historiadores. Se uma universidade vier a precisar contratar um historiador para administrar seus acervos, museus ou coleções, a lei o permitirá, ou mesmo o demandará, tendo em vista o Art. 6º; a contratação de um professor obedece a outros critérios.

7. O parágrafo único incluído no Art.  4º deixa clara a necessidade inegociável de formação em curso de licenciatura para a atuação na educação básica.

8. A alteração proposta no Art.  5º é necessária para não haver conflito interno com a nova forma do Art. 3º, particularmente seu inciso V, que prevê o reconhecimento profissional daqueles que não sejam portadores dos diplomas anteriormente arrolados. Sendo eles plenamente reconhecidos como historiadores profissionais, não é possível exigir-lhes os diplomas.


A proposta reproduzida acima, apresentada pela Sociedade Brasileira de História da Ciência (SBHC) no dia 03 de setembro, era um significativo avanço em relação ao Projeto de Lei original e eliminava vários de seus problemas. No entanto, algumas semanas depois, a SBHC fez um acordo com a Associação Nacional de História (ANPUH) e retirou essa proposta de emenda, passando a apoiar uma outra proposta muito pior - e que é totalmente incoerente com relação aos pronunciamentos antigos da SBHC e de sua presidente. 

 Veja nossa crítica à proposta conjunta da ANPUH + SBHC nesta postagem:
http://profissao-historiador.blogspot.com.br/2013/10/critica-de-roberto-de-andrade-martins.html

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