Veja o que os historiadores da Grã-Bretanha pensam a respeito do Projeto de Lei 4699/2012, de regulamentação da profissão de historiador:
A história não é um serviço técnico, cujos
limites possam ser estritamente definidos pelas instituições de ensino superior
ou outras instituições certificadoras. É um empreendimento crítico, avaliativo,
interpretativo. Sua livre prática é vital para o funcionamento de uma sociedade
livre e saudável.
A Royal Historical Society, fundada em 1868, é a principal associação da Grã-Bretanha dedicada à promoção e defesa do estudo acadêmico do passado. O Presidente da Royal Historical Society, professor Peter
Mandler, divulgou um documento criticando a proposta de regulamentação da profissão de historiador (Projeto de Lei 4699/2012) que está tramitando pela Câmara dos Deputados.
14 de Agosto de 2013
A quem possa interessar:
Foi
trazida à nossa atenção uma tradução para o inglês do “Projeto de Lei 4699/2012”,
que atualmente está sendo discutido pelos legisladores do Brasil, e que está
causando grande preocupação internacional entre os historiadores profissionais.
Esta proposta de legislação parece restringir não apenas o ensino de História,
mas também a pesquisa e a escrita da história no Brasil a quem tem títulos em
História, emitidos por instituições brasileiras, ou estrangeiros ‘validados’.
Parece
que está sendo feita alguma analogia, por exemplo, com o licenciamento profissional
de psicólogos ou engenheiros para lhes conferir o direito de realizar serviços
técnicos. Esta analogia nos parece ser falsa e perigosa. Em primeiro lugar, é completamente
razoável restringir o desempenho de alguns serviços técnicos deste tipo àqueles
que têm a certificação adequada; mas certamente não é razoável
restringir “organização de informações” ou “elaboração de pareceres,
relatórios, planos, projetos, laudos e trabalhos”, mesmo sobre esses
temas. Realmente, os profissionais muitas vezes dependem de “informações, pareceres,
relatórios, planos, projetos, laudos e trabalhos” de pessoas externas para criticar
e melhorar as suas próprias práticas. Qualquer restrição deste tipo de
comentário prejudicaria seriamente as práticas que se quer proteger.
Mas, em
segundo lugar, a história simplesmente não é como a psicologia ou a engenharia.
Não é um serviço técnico, cujos limites possam ser estritamente definidos pelas
instituições de ensino superior ou outras instituições certificadoras. É um
empreendimento crítico, avaliativo, interpretativo. Sua livre prática é vital
para o funcionamento de uma sociedade livre e saudável. A nossa própria
experiência do estudo profissional de História atesta que algumas das maiores
contribuições para este estudo foram feitas por filósofos, linguistas,
cientistas, políticos e mesmo por cidadãos comuns e criativos, que assumiram um
interesse humano natural sobre o seu próprio passado e pelo dos outros. (Um dos
maiores historiadores da China já produzidos por este país [Inglaterra] era um
químico, Joseph Needham.) É claro que os historiadores acadêmicos sempre julgarão
tal tipo de trabalho por seus próprios padrões, para seus próprios propósitos.
Mas não devemos pré-julgar o valor de tal trabalho, negando a qualquer pessoa o
direito legal de empreendê-lo.
Confio
que os legisladores brasileiros reconhecerão quão prejudicial seria tal
limitação para a qualidade da vida intelectual e cultural em seu país, e rejeitarão
qualquer lei desse tipo.
Atenciosamente,
Peter
Mandler
Presidente
Carta original, em inglês:
https://dl.dropboxusercontent.com/u/4072208/Royal-Historial-Society-Brazilian-history-legislation.pdf
https://dl.dropboxusercontent.com/u/4072208/Royal-Historial-Society-Brazilian-history-legislation.pdf
Bastante interessante o texto acima. Realmente, o exercício da História tem que ser um direito de todos e não de uma classe que deseja criar privilégios para si.
ResponderExcluirDe fato, seria uma grande vergonha para todos nós se apenas o Brasil criasse uma legislação garantindo uma reserva de mercado para os diplomados em história, proibindo todas as outras pessoas de se dedicarem às atividades de ensino e pesquisa histórica. Um bom projeto de lei de regulamentação deveria começar assim: "É livre o exercício da atividade de historiador."
ExcluirOlá colegas...Acredito que ninguém informou os colegas ingleses que no Brasil não há concursos para historiadores nos Museus, Orgãos de Preservação de Patrimônio e Arquivos (local onde sua presença é fundamental) exatamente porque a profissão não é Regulamentada, como já é a dos sociólogos, geógrafos, museólogos....E curiosamente, no site dos amigos "Royals", há homenagens aos historiadores britânicos que auxiliaram na institucionalização da história na Grã-Bretanha. Ou seja, no Império pode, nas ex-Colônias - ai de nós - who cares? Abraços bem-humorados ao dono do blog e aos colegas leitores.
ResponderExcluirPrezada professora Cristina. Não sei se entendeu o que nós, do blog, estamos querendo fazer. Ninguém é contra a criação de uma regulamentação da profissão do historiador. No entanto, quase todas as associações e entidades (exceto a ANPUH) são contra o texto do projeto de lei que está tramitando no Congresso. Por favor, não confunda as coisas. É possível criar uma regulamentação que permita a abertura de concursos mas que não crie um monopólio e não proíba outras pessoas de exercerem atividades de pesquisa e ensino de história para as quais estejam qualificadas. A escolha não é entre nenhuma regulamentação ou o atual projeto de lei. A escolha é entre muitas possíveis redações para um projeto de lei, de tal modo a não criar uma reserva de mercado que prejudique outras pessoas que também são competentes.
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